O Blog do Moraes traz um post especial sobre o Panela do Diabo com depoimentos de Johnny Boy Chaves que gravou o disco de Raul e Marcelo Nova e um bate-papo imperdível com PC Rock sobre o disco também e e a vida e obra de Raul.
O dia 11 de fevereiro deste ano foi a última vez que o Nasi tocou no General. Em todas as edições do show do cantor no General, o baixista que acompanha a banda é Johnny Boy Chaves.
Johnny Boy tem um vasto currículo mas um dos marcantes é que ele participou da gravação do Panela de Diabo de Raul Seixas e Marcelo Nova. O Panela foi a última gravação de Raul.
Sendo assim, mandei algumas questões para o músico sobre o Panela para fazermos uma matéria do disco aqui. Coincidentemente mandei no mesmo dia do lançamento do documentário "Raul - o início, o fim e o meio". Johnny me mandou as perguntas após um mês.
Músico e produtor do cenário nacional Johnny Boy Chaves tocou, arranjou e gravou com grandes nomes do Rock, Blues e da Música Popular Brasileira como: Raul Seixas (Panela do Diabo), Camisa de Vênus, Ira (Isso é o amor), André Christovam, Nasi e os Irmãos do Blues, Marcelo Nova, Made in Brazil, Incríveis entre outros. Atualmente toca com Nasi em sua carreira solo.
"Um resumo de toda minha história com artistas e amigos geniais, com os quais tive e tenho o prazer de aprender muito, dividindo os palcos. Minha segunda família."
O Panela do Diabo foi lançado em 1.989 e teve sucessos como Rock ´n Roll, Be Pop Lula, Pastor João e a Igreja Invisível. Quando estava chegando nas prateleiras, Raul morreu.
Fala grande Johnny . Você participou da concepção dos arranjos e da
gravação do disco?
Sim participei. Primeiro com o Raul e o Marcelo,
depois com a banda. Bem, eu conheci as canções na casa do Raul, as músicas só com a voz e
violão. Eu tocava junto, escrevia e depois pensava na introdução, solo e ritmo.
As introduções de ‘Pastor João’, ‘Carpinteiro do Universo’, ‘Século XXI’ e
‘Nuit’, eu lembro que pensei muito em casa, estudando com um velho violão e
depois no estúdio eu passava minhas idéias com a Envergadura e então tocávamos
para o Raul e o Marcelo, e assim todos juntos finalizamos os arranjos.
Tivemos também durante as gravações toda uma equipe de técnicos e produtores como
o Paulo Calazans que nos ajudou muito durante as gravações, era ele que passava
a maior parte do tempo com a banda. Pude tirar várias dúvidas com ele, coisas
que ficaram bem legais na prática.
Uma coisa que eu acho muito interessante é
que não usávamos partituras nem cifras, foi tudo tocado ao vivo sem a ajuda de
click, tudo na pulsação da banda, isso é muito difícil e o resultado foi muito
bom. Passávamos e gravávamos foi assim que rolou.
Fale sobre os integrantes do Envergadura Moral
Falar desses brothers é falar de irmãos, né? Estivemos muito tempo na estrada juntos em boas e roubadas, mas sempre fomos muito unidos, dentro e fora dos palcos.
O Gustavo Mullen é um gentleman, grande amigo, um coração maior ainda e tem seu jeito todo ímpar , sempre completou com suas atitudes e idéias.
O Franklin Paolillo é um grande músico que já fazia parte de toda essa história. Muita experiência, o cara certo para todas, pesadas, swingadas, viradas, um baterista de rock’n roll mesmo, de mãos cheias e também um super companheiro de estrada, um amigo por quem eu tenho grande carinho e de quem sou muito fã.
Peth Calazans, o mais novo entre nós, mas é também sem dúvida o mais alegre, espirituoso, um tirador de sarro, inspirado e que músico, ô nego bom, talentosíssimo. Toca contrabaixo muito bem com a firmeza de quem conhece harmonia, todas as levadas e também toca teclado muito bem, um perigo. Parceiro de grandes momentos, um ótima pessoa, meu brother.
Como era convivência entre
Marcelo e Raul?
Bem, a convivência entre Raul e Marcelo sempre
me pareceu de admiração e respeito, pois o Raul não dividia um disco com
qualquer pessoa, ou show, etc...
Enfim, o Marcelo também era muito fã do Raul,
ele já havia gravado com o Camisa de Vênus ‘Muita estrela pra pouca constelação’,
e eu vejo a Panela como consequência dessa parceria.
Na estrada as coisas eram
muito intensas, viagens, hotéis, entrevistas e, é claro, shows, muitos, eles
sempre me pareceram parceiros, é o que eu acho.
Como foi trabalhar com Raul?
Como era a relação dele com a banda e com você?
Sempre foi uma relação respeitosa e carinhosa. O
Raul era um gentleman, muito calmo e tranquilo. Eu lembro dele sempre nos
tratando muito bem, passando confiança e segurança, afinal estava ali o Raul de
muitos discos, várias gravações, todos os maestros, músicos e bandas... e
também dando sinais de cansaço já com a saúde não muito boa, mas para mim é um
orgulho fazer parte dessa história.
Uma lembrança boa da relação com o Raul é a
música ‘Século XXI’, quando eu terminei o arranjo da base fiquei muito
preocupado, pois eu havia trocado o tom da música, já que eu achava o tom
original baixo para a voz do Raul, e modulei para dois tons acima. Quando eu
passei com o Raul não falei nada, preocupado com o que ele falaria, mas ele
gentilmente disse: “é ficou bom, em que tom está?” Eu respondi, “em Mi maior” e
ele sorriu balançando a cabeça com um sinal de OK, pra mim foi muito bom, um
alívio.
Esse foi o Raul que eu conheci e convivi e eu ainda fui brindado com o
solo de violão dessa música, alguns convidados gravaram, mas o Raul não gostou,
uma tarde eu pedi para que o produtor me deixasse gravar um solo simples que
estava na minha cabeça e foi esse solo que ficou valendo, é simples e bonito.
Melhor ainda a história, pois quem aprovou foram o Raul e o Marcelo.
E claro que não poderia deixar o meu grande amigo PC Rock de fora dessa, o maior fã do Raul da cidade.
Perguntei pra ele sobre o Panela e a relação de Marcelo com Raulzito. Confira.
Gosto desse disco! É um disco muito bonito, triste e auto biográfico, em minha
opinião...
Vejo Raul se despedindo o tempo todo nele...
Na segunda metade da década de 80 Raul estava numa fase
terrível em sua vida! Alcoolismo, solidão, ostracismo, doente, sem contrato com
gravadora alguma, sem shows, enfim sem NADA!
Marcelo ainda gozava de certa fama vinda de seu trabalho
com o Camisa de Vênus (uma das melhores bandas que eu ja vi) e também de seu
trabalho solo.
Naquele momento não precisava nem de Raul nem nada pra se
auto-afirmar, ao contrário! Raul era sinônimo de problema certo! Mais
temperamental que Tim Maia! Ninguém queria vincular seu nome a ele!
Marcelo pegou Raul nessa fase negra e o levantou novamente!
Se responsabilizou por shows, compromissos e até um disco inédito e
incrivelmente Raul cumpriu TUDO! Cada compromisso, como há muito não fazia!
Quem é fã sabe das cartas que Raul escreveu de próprio punho pra uma de suas
ex-esposas nessa época contando orgulhoso sobre os convites de shows que
estavam "pintando a rodo" segundo ele, até aproveitando pra esboçar,
quem sabe, uma possível volta ao relacionamento.
Raul morreu com dignidade num momento de muito sucesso,
ovacionado pelo público, crítica e midia.
E tudo isso EXCLUSIVAMENTE graças ao Marcelo!
Quem duvida disso pergunte a quem realmente era amigo
intimo e querido de Raul como Jerry Adriani e Wanderléa e veja o que eles dizem
sobre o Marcelo.
Agora é óbvio que estando ao lado de uma lenda, como era o
caso de Raul que Marcelo gozasse de situações tais como multidões em seus
shows, acesso a canais de TV como Rede Globo, SBT e todos os outros, shows em
locais alto nível como o Canecão no Rio, por exemplo , etc, etc... tudo isso
graças ao nome de Raul.
Oras mas e daí??? Qual o problema nisso??? Toda essa glória
do nome de Raul só voltou à tona mesmo graças a ele, Marcelo Nova.
PC E RAUL
Claro que tinha que dar uma abusadinha do PC e perguntar mais algumas coisas sobre Raulzito
Como o Raul surgiu na sua vida?
Filho de pai alfaiate e mãe costureira,
o rádio foi muito presente em minha vida, uma vêz que além do fato de ambos
serem muito ligados à música, acordavam muito cedo pra costurar (3:30 da manhã)
e religiosamente todo santo dia, a primeira coisa que se fazia em casa era
ligar o rádio e a última, desligar.
Rádio AM e não FM!!
Emissoras FM eram, ainda, muito incomuns no Brasil até
o começo dos anos 80 e a proporção delas em relação ao AM era infinitamente
menor se compararmos aos dias de hoje.
O fato é que nos anos 70, o popular era absolutamente
diferente e oposto ao que é popular hoje e após 1973, ano do lançamento do
álbum krig-ha bandolo, um dos artistas mais executados por todas as emissoras
desse país, depois de Roberto Carlos, era exatamente RAUL!
Raul explodiu com tanta força após 1973 que na década de 70
inteira, só ele e Rita (Lee) eram "sucesso comercial" no ROCK. Por incrível que pareça muita gente fez parte da cena ROCK
no Brasil daquela década mas só Rita e Raul eram capazes de vender muito e
fazer muito dinheiro nessa fatia de mercado.
Por isso mesmo o Rádio (que de modo geral tocava
85% de música de qualidade) tocava muito, entre outras coisas legais, RAUL!
Fui bombardeado pela obra dele minha infancia toda sem
saber que ele era, de fato, ele! Ouvia muita música de Raul mas como
um garotinho brincando pela casa, eu nem imaginava de quem se tratava e só
quando já tinha uns 12 anos de idade lá por 1981 é que fui começar a ouvir
música por iniciativa própria.
Nessa época me chegou nas mãos um LP de
Raul, artista totalmente desconhecido pra mim (eu achava), mas
foi então que percebi, faixa após faixa do disco, que eu conhecia ABSOLUTAMENTE
TODAS AS MÚSICAS! Então ensei comigo mesmo. PÔ , esse é o RAUL??? QUE
DEMAIS!!!!
Me identifiquei tanto que a partir daí foi compulsivo,
não parei mais até ter todos os LPs (o CD ainda não tinha sido inventado) e
depois, mais tarde, todos os CDs também.Vivi a época de esperar o lançamento de um disco novo de Raul, ir na loja comprar
ansioso pra voltar pra casa e colocar o bolachão tocar na vitrola pra
conhecer as músicas novas!
Qual a fase e disco que você prefere do Raul?
Muito difícil responder essa mas o LP
NOVO AEON, é muito FODA! Uma obra de arte de beleza realmente singular!
Como você dimensiona a obra e o legado que o Raul deixou?
Acho muito difícil falar sobre algo tão
complexo em um bate-papo rápido como é o caso aqui mas Raul foi, sem medo de
errar, um dos maiores gênios que o Brasil ja viu... Raul se tivesse nascido
americano ou Inglês, com seu ímpeto, sensibilidade, coragem e inteligência,
teria sido maior que Bob Dylan, Lennon e afins! ah ah ah! Deve ter gente achando que é exagero mas nem tanto...
Acredite. Nem tanto!
Raul tinha o dom !
Conseguia escrever para o médico e para o lixeiro, para o
rico e para o pobre com a mesma palavra! Isso é algo muito raro e genial!
Graças a esse precioso aprendizado é que Paulo Coelho, por
exemplo, ficou trilhonário fazendo livro de qualidade duvidosa mas com endereço
certo... Ele mesmo exalta sua gratidão à Raul por esse fato em qualquer
entrevista... Pena ter usado para o mal... rs rs
Com isso tudo, Raul arrebanhou uma legião enorme de fãs em
absolutamente todas as classes sociais e mesmo vivendo uma vida tão conturbada
com tanto altos e baixos até mesmo após sua morte seus discos figuram SEMPRE
entre os mais vendidos!
Eu que em 1986, num show em Tatuí, fui
apresentado na cidade pelo saudoso Zé Galinha como sendo o "Filho de
Raul". Tenho de verdade um filho com nome RAUL e uma filha
nascida exatamente no mesmo dia e mês que Raul Seixas nasceu chamada, Alice
Maria (que é nome de uma linda canção presente no primeirísimo album:
Raulzito e os Panteras).
O trabalho de Raul Seixas é algo realmente
consistente, intenso, as vezes doce outras vezes furioso! Raul viveu e
acreditou na sua própria verdade! Manteve-se fiel a ela e não se vendeu
até o fim! Acho que esse é seu maior legado!
É uma obra atemporal, sem prazo de validade e
contemporânea, muito diferente do lixo que faz sucesso por apenas algumas
semanas hoje em dia e é logo descartado e esquecido pelas próprias pessoas que
o consomem.
É porisso que você nunca vai à shows durante 2 meses
seguidos em que a platéia grite:
"Tóca Michel Teló, tóca Michel Teló!", no
entanto, ao que tudo indica, jamais se livrará do SONORO: "TÓÓÓÓÓCA
RAUUUUULLLLLLL".
É uma simples questão de qualidade...
Arrepiante !!! Valeu PC !!
Que texto lindo! ainda tem gente que pensa nesse Brasil!
ResponderExcluirParabéns belíssima historia
gostei pra caramba...show!
ResponderExcluirPuxa vida até que enfim alguém que entende do Raulzito e não diz só besteira como cansei de ver por aí.
ResponderExcluirAchei a entrevista por acaso na net e valeu apena ler.
Parabéns.
Marcão Bass